É nosso, isto é, não nos pertence

Um quilo de chumbo não pesa mais do que um quilo de penas? Entre as penas pesadas e os levíssimos soldadinhos de chumbo se busca uma perda de eloquência do desejo. Porém, cada simulacro de morte encerra a vontade de ser seu encenador e espectador. E a forma persegue a matéria. Morte em segunda mão. Face cega a esboçar um sorriso à causa que infinitamente passa e lhe pede esmola. Festim de fim para o qual se juntaram os restos. Que faremos nós deste gosto e do desgosto?

Em rigor um quilo de chumbo não pesa mais do que um quilo de penas. Deste lado, os olhos amadurecem e caem como certos frutos desejam ser pisados. Aqui na terra como no céu, o terror das palavras pertence ao passado. Importa saber em que terreno as palavras caíram e experimentar todos os desvios que permitem caminhar para elas, fora do tempo.

Regina Guimarães

para livro A hora sua